Para o CEO da Strong Roots, Samuel Dennigan, transparência e impacto ambiental são uma demanda crescente, especialmente da geração Z
Os rótulos de carbono e os rótulos climáticos, que já podem ser vistos estampados em produtos no varejo dos EUA e de países da Europa, comunicam ao consumidor dados sobre emissões de carbono, emissões de gases com efeito de estufa e métricas relacionadas com o clima.
De grosso modo, os alimentos representam cerca de oito toneladas – por volta de 17% – de emissões por domicílio nos EUA e UE. Vale registrar que, entre as duas rotulagens, o rótulo climático é mais holístico e inclui mais métricas do que um rótulo de carbono, que tende a focar apenas nas emissões de carbono. Carnes, ovos, queijos, frutas, legumes, feijões e nozes, em maior ou menor grau, todos têm sua pegada de carbono.
A Tenzing, uma fabricante britânica de bebidas energéticas, foi a primeira marca de refrigerantes a introduzir, em 2021, a rotulagem de carbono nos seus produtos. Em 2020, o Just Salad, rede de restaurantes fast casual fundada em 2006, foi considerado o primeiro restaurante a utilizar a rotulagem de carbono no seu menu.
Samuel Dennigan, fundador e CEO da Strong Roots, empresa da Irlanda, presente nos EUA e Reino Unido e que fabrica refeições congeladas à base de plantas, afirma que a rotulagem da pegada de carbono é um novo nível de transparência e responsabilidade das marcas para compreender melhor o seu impacto ambiental.
Dennigan aponta que o consumidor já começa a perceber as diferenças entre os rótulos de pegada de carbono e de pegada climática. “Para muitas marcas, a adição de rótulos sobre a pegada climática é fundamental para a evolução do seu posicionamento de marca, especialmente à medida que os consumidores olham cada vez mais para o impacto climático das suas compras de alimentos e tomam decisões em conformidade”, afirma. “Os rótulos da pegada de carbono são um diferenciador para os consumidores, sinalizando que uma marca tomou medidas para abordar o impacto de carbono dos seus produtos e está tornando-o publicamente conhecido”, completa.
Dennigan diz que a rotulagem de carbono introduz um novo nível de transparência e responsabilidade das marcas para compreender melhor o seu impacto ambiental. “Se uma marca não conhece o seu impacto ambiental, não tem os conhecimentos necessários para melhorá-lo e os consumidores não têm os recursos para tomar decisões de compra mais precisas sobre o estado do planeta”, afirma Dennigan.
“A rotulagem de carbono é como abordar metas pessoais de condicionamento físico – você pode precisar medir o peso ou a ingestão calórica para atingir um objetivo desejado, para examinar onde está atualmente e onde deseja estar”, diz o CEO da Strong Roots. “Conhecemos os objetivos globais para o planeta e, para consertar os nossos sistemas alimentares, precisamos reduzir duas gigatoneladas de carbono até 2050”, completa.
A Strong Roots fechou uma parceria com a CarbonCloud, empresa de software de inteligência climática na Suécia que permite a ela rastrear, calcular e comunicar a sua pegada de carbono em todas as suas cadeias de fornecimento. Eles podem medir diariamente suas metas climáticas por meio do sistema CarbonCloud e a partir dessas informações calcular a linha de base de emissões e criar um roteiro para identificar áreas onde podem melhorar em todo o processo de produção.
O CarbonCloud calcula as emissões da Strong Roots por quilograma de produto alimentar, usando pesquisas e estatísticas globais para calcular as emissões com a maior precisão possível.
Até agora, a Strong Roots arrecadou 95 milhões de euros (R$ 494 milhões na cotação atual) em investimentos. Em 2021, a McCain Foods investiu US$ 55 milhões (R$ 268 milhões) na Strong Roots, dando-lhes uma participação minoritária na empresa.
Como a rotulagem evolui
Historicamente, a rotulagem dos alimentos no Reino Unido remonta a 1938, mas foi só em 1996 que a regulamentação foi modernizada. Nos EUA, a rotulagem obrigatória dos alimentos começou em 1913, mas foi em 1994 que apareceu pela primeira vez o rótulo de Informação Nutricional dos EUA, que foi revisto em 2016 – no Brasil, a rotulagem nutricional foi regulamentada em 1998.
“Já se passaram mais de 25 anos desde que as embalagens de alimentos exibiram pela primeira vez informações nutricionais, permitindo aos consumidores tomar decisões mais precisas sobre sua saúde. Hoje, nem podemos mais imaginar nossa alimentação sem elas”, diz Dennigan. “A rotulagem de carbono está sendo cada vez mais mais adotada e é disso que a indústria e o planeta precisam neste momento”, completa.
Segundo o executivo, “ela ainda não está na moda, mas é uma tendência crescente entre as marcas comprometidas com a transparência do seu impacto ambiental, e é necessário especialmente agora que estamos assistindo ao aumento do nível do mar, aos incêndios florestais e ao deslocamento em massa da população”. Dennigan diz que o objetivo é mostrar aos consumidores que cada compra tem um impacto de carbono e incentivá-los a tomar decisões alimentares mais informadas.
“Esperamos partilhar conhecimento e iniciar conversas que direcionam os consumidores para opções alimentares mais ambientalmente conscientes, e a rotulagem de carbono é fundamental para educar os consumidores a darem esse passo extra”, disse Dennigan. “À medida que cresce essa consciência em torno do impacto do carbono, queremos que os consumidores comecem a exigir esta transparência de todas as empresas, especialmente das grandes que causam o impacto”, completa.
Dennigan diz, ainda, que se uma marca sentir pressão dos consumidores para ilustrar publicamente a sua pegada de carbono nas suas embalagens, trabalhará muito mais para melhorá-la.
No caso da Strong Roots, a empresa está fazendo uma substancial mudança em suas embalagens ao colocar detalhes de carbono estampando o alimento. “Colocar os detalhes de carbono na frente da embalagem é uma pequena mudança para nós, mas tem um grande impacto em posicionar a sustentabilidade em primeiro lugar”, afirma.
Dennigan acredita que a rotulagem da pegada de carbono nas embalagens dos alimentos tem o potencial de mudar o comportamento daqueles que não procuram pela informação – e mesmo entre aqueles que estão ativamente tentando evitá-la.
“Os rótulos da pegada de carbono são apenas um passo, por isso vamos torná-los tão simples e rápidos quanto possível para ajudar os consumidores a compreender o impacto das suas escolhas alimentares no planeta”, afirma. “Mas esse tipo de penetração no mercado leva tempo. Neste momento, 31% dos consumidores dizem que o rótulo mais importante nas embalagens dos alimentos é o das calorias. Mas na próxima década, os rótulos da pegada climática serão mais importantes do que as calorias para os consumidores”, acredita Dennigan.
Compradores de alimentos: os novos atores do clima
Um relatório sobre climavorismo (escolha de alimentos em função dos impactos climáticos), da consultoria global Kearny, aponta que 42% dos compradores de alimentos sempre ou quase sempre consideram os impactos ambientais ao tomar decisões de compra.
A pesquisa de 2022, chamada “Os rótulos da pegada de carbono promovem dietas climáticas” e publicada no Journal of Environmental and Economics and Management, mostrou que os rótulos da pegada de carbono diminuíram a probabilidade de selecionar uma refeição com alto teor de carbono em aproximadamente 2,7 pontos percentuais. O experimento de campo foi conduzido em cinco refeitórios universitários localizados em uma faculdade da Universidade de Cambridge.
Dennigan diz que nos últimos anos a empresa tem visto um grupo de consumidores que define o mercado e que procuram fazer compras de alimentos que se alinhem com os seus valores. “Esses valores tendem consistentemente para o ambientalismo e a sustentabilidade”, diz. “Nossa pesquisa interna mostra que, embora a saúde seja um fator dominante para a escolha dos nossos produtos, 45% das pessoas o fazem por causa de preocupações ambientais. Vemos consumidores de alimentos defendendo a consciência climática em suas dietas gerais, afetando o que compram nas lojas”, completa.
Segundo o executivo, “as pessoas estão identificando diferentes subcategorias de dietas que refletem a responsabilidade climática colocada na fabricação de certos produtos”. Dennigan acrescenta que se trata de dietas como a flexitariana, a climática e a sustentaria – cada uma com uma perspectiva diferenciada sobre como farão escolhas alimentares que se alinhem com os seus valores conscientes do clima.
Em um relatório da McKinsey de 2022, 88% dos americanos da Geração Z disseram que não confiam nas afirmações ambientais, sociais e de governança (ESG) das marcas”, acrescenta Dennigan.
“Há uma geração mais jovem, especialmente a da Geração Z, que se sente incrivelmente forte com suas posições em relação à sustentabilidade ambiental”, afirmou. “Os consumidores desta geração têm muito mais acesso à investigação educacional, aos dados e à tecnologia do que as pessoas tinham há 50 anos e estão muito mais expostas às consequências da crise climática”, completa.
Dennigan diz que há 68 milhões de pessoas na geração Z nos EUA (o Brasil tem cerca de 30 milhões de jovens que nasceram entre 1995 e 2010). “À medida que esta geração cresce e se torna parte integrante da nossa força de trabalho, com maior poder de compra, veremos mudanças significativas devido à sua dedicação à sustentabilidade e à preocupação com o ambiente”, acrescenta Dennigan.
Carne ultra processada e meio ambiente: xeque
Dennigan diz que a bolha da carne alternativa estourou. “Os resultados da nossa pesquisa mostram que os consumidores estão cansados de alimentos excessivamente processados e cheios de aditivos, até mesmo à base de plantas, e estamos vendo uma grande mudança no sentido de que os consumidores preferem opções de alimentos vegetais inteiros, ricos em nutrientes e com uma lista curta de ingredientes”, diz Dennigan.
Em fevereiro de 2023, o “Business Insider” informou que as vendas da Beyond Meat caíram, com as receitas do quarto trimestre despencando 20,6% e um prejuízo registrado de US$ 366 milhões (R$ 1,781 bilhão) em 2022. “Em 2019, os produtos de carne alternativos foram criados para assumir e resolver a crise climática, tornando-se a porta de entrada para o veganismo. Todos aderiram, incluindo os investidores”, disse Dennigan.
“Os consumidores ficaram curiosos e as vendas de carne falsa aumentaram quase 20% naquele ano. Agora, a indústria da carne falsa caiu. Nos EUA, as vendas de carne alternativa caíram 7,3% em relação ao ano anterior, para US$ 1,1 bilhão (R$ 5,35 bilhões), enquanto as unidades processadoras caíram 15,6%.” Dennigan diz que a dura realidade é que os consumidores não gostam desse tipo de alimento. “Esta é uma nova era ‘baseada em vegetais 3.0’”, afirma. “Devemos nos concentrar na criação de opções que preencham a lacuna de sabor, saúde e sustentabilidade que os produtos de carne falsa não conseguem satisfazer.”
O executivo acredita que a tecnologia desempenhará um papel crucial na produção sustentável de alimentos no futuro, por meio do avanço de práticas agrícolas sustentáveis, como a agricultura regenerativa, melhores iniciativas de saúde do solo e redução da pegada de carbono dos alimentos.
“Nossos fornecedores estão na vanguarda da tecnologia agrícola e inovam ao empregar uma grande equipe de agrônomos para investigar novos desenvolvimentos tecnológicos para maximizar a eficiência crescente e minimizar o desperdício”, disse Dennigan. “Eles também incentivam uma fusão de técnicas antigas e novas: por exemplo, a rotação de culturas encontra o monitoramento por GPS para garantir que o melhor da sabedoria antiga possa informar desenvolvimentos científicos de ponta”, completa.
Dennigan acredita que as principais marcas alimentares que surgirão na próxima década darão prioridade à saúde do solo, adotarão a agricultura baseada na tecnologia e criarão um cenário vantajoso para todos em termos de sustentabilidade e rentabilidade. “E eles terão os rótulos da pegada climática para provar isso”, disse Dennigan. No entanto, ele admite que, embora a Strong Roots seja atualmente uma organização neutra em carbono, devido à forma como os sistemas alimentares globais funcionam não existem alimentos neutros em carbono.
“Mesmo nas circunstâncias mais ideais, uma certa quantidade de gases com efeito de estufa é criada na produção de alimentos”, diz Dennigan. “Estamos empenhados em eliminar, tanto quanto possível, os combustíveis fósseis das nossas operações e, para isso, examinamos cada passo do percurso dos alimentos, desde o campo até o congelador.”
“Face às alterações climáticas, alcançar a neutralidade de carbono nos nossos sistemas alimentares não é uma opção; é uma necessidade”, diz. “Ao adotarmos práticas sustentáveis, podemos garantir que os alimentos que consumimos têm um impacto positivo no ambiente. Sabemos que os alimentos podem ser melhores e temos a missão de corrigir isso”, completa.
- Jennifer Kite-Powell é colaboradora da Forbes EUA. Escreve sobre inovação, ciência e tecnologia na indústria, arte, agropecuária, mobilidade e saúde.
Fonte: Forbes